terça-feira, 22 de agosto de 2006

Vinte primaveras

Aniversariar nunca foi o meu forte. É acordar e se lembrar do fato de que todos os seres humanos que sabem da sua existência, e até mesmo alguns que não sabem, irão ligar parabenizando-o pelo incrível fato de você ter sido expelido violentamente através de uma vulva maternal gosmenta e pegajosa e espancado vida adentro há um amontoado de anos que cresce em número invariavelmente aniversário após aniversário. Isso incluindo aquela tia distante que há muito perdeu a noção da realidade e que liga um ou dois meses antes da data correta jurando que acertou em cheio e oferecendo, inclusive, provas de que você nasceu naquele dia e não no dia certo. Ou então aquela avó meio caduca que é posta à força do outro lado da linha e nem sabe ao certo o que e a quem parabeniza, a coitada. E como poderia deixar faltar o tradicional avô que pega na extensão e parece não querer largar mais enquanto faz previsões positivas para todas as áreas da sua vida pelos próximos quarenta anos, sem perceber que você caiu duro de tédio lá na outra extremidade da conversação.
Entra ano, sai ano, e é sempre o mesmo tal de 'primaveras' pra cá, 'tá ficando velho' pra lá e 'agora já pode ser preso' acolá. Mas a gente vai aprendendo com isso. E com o passar do tempo a gente vai desenvolvendo técnicas de conversação ao telefone no dia do aniversário, como concordar maquinalmente com os mais variados níveis de maluquice senil, segurar a risada enquanto uma pessoa ou um grupo delas canta musiquinhas comemorativas que te fazem lembrar que agora você é um fracassado um ano mais velho, ou abraçar o silêncio após um simples e lacônico 'oi, [inserir nome do infeliz aqui], parabéns'.
Pensando bem, aniversários podem ser divertidos.

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