sexta-feira, 25 de julho de 2008

Olimpíadas vermelhas

"É triste ver os Jogos Olímpicos sendo ofuscados pela Coca-Cola e pelo McDonald's", desabafou a guia turística durante um city tour em Atenas, no começo do ano. Passávamos pelo estádio berço das Olimpíadas modernas, e Zoi ('vida' em grego), uma guia radicalmente anti-corporativista dona de uma simpática, porém gélida personalidade para grego ver, imiscuía criticismos às luxuosas lojas atenenses em meio a informações históricas sobre o Parthenon como quem lixa as unhas enquanto canta a macarena.
O que diria Zoi, então, do iminente Beijing 2008? Em meio a esforços de reconstrução devido a terremotos recentes, uma constante tensão política entre Tibete e o governo do país, tentativas artificiais de amenização dos efeitos nocivos do crescimento econômico chinês no ambiente, protestos de atletas, além de uma pressão cada vez maior exercida sobre a população para que nenhum desses detalhes incômodos atrapalhe o andamento de um megaevento como os Jogos Olímpicos, a China tem em mãos um enorme elefante branco prestes a explodir e espalhar matéria fecal por cima das milenares muralhas e da Praça da Paz Celestial.

Tudo, obviamente, mascarado por ostensivas campanhas envolvendo bonequinhos da péssima animação Kung-Fu Panda no McLanche Feliz (que na China se chama McMao Lexotan 100mg) e inserções massacrantes da Happiness Factory da Coca-Cola nos intervalos de todas as partidas de todas as modalidades esportivas. Até a Pepsi mudou a cor da embalagem, do azul para o vermelho, em uma jogada de marketing que deve ter deixado os executivos da The Coca-Cola Company sem saber o que os atingiu. Só não vale publicidade de cigarro e de estimulantes sexuais, até porque a última coisa que eles precisam por lá é mais um lote de criancinhas abandonadas dentro de quartos escuros soltando fumaça pelas ventas.
O Beijing 2008 já nasceu fadado à polêmica. Promete entrar para os anais da história como uma das edições mais controversas dos Jogos Olímpicos - um evento unificador dos povos, simulacro da paz mundial, cujo logotipo simboliza a união dos cinco continentes que, apesar da parafernália tecnológica e da esculhembação cultural pós-moderna, estão ficando cada vez mais distantes entre si. O desfecho é sempre o mesmo: os EUA levam todas as medalhas de ouro, as russas esculacham geral na ginástica, a Daiane dos Santos torce o joelho, alguma machona da natação toma bomba e outra leva uma sova do pai em rede nacional.
Mas o que diria Zoi de tudo isso?

domingo, 20 de julho de 2008

Volta, Glória Maria!

Pra mim é fácil saber quando chegou o domingo. Normalmente é o dia em que eu tenho muita vontade de dar uma de Isabella e rezar pra cair pelado em um tonel de ácido sulfúrico. E isso só de ouvir a voz do Fausto Silva e as risadas gravadas do auditório holográfico que eles colocam para assistir a vídeo-cacetadas filmadas em meados do século passado, onde uma pessoa idiota invariavelmente é sodomizada por um animal doméstico ou por um parente mais idiota do que ela própria perante a câmera. Não é fácil para mim nem pra ninguém.
Mas se o Faustão sofresse falência múltipla de órgãos durante uma cirurgia de redução do estômago, ninguém ia dar falta daquela massa amorfa de gordura trans por, no mínimo, uns dez anos mais, o tempo suficiente para que a Globo se utilizasse do seu "Q" para encontrar um substituto. Agora, no momento em que tiram a Glória Maria do Fantástico e colocam uma tal de ex-meteorologista recauchutada que comeu o Zeca Camargo à força no teste do sofá, é sinal de que a Rede Globo de Televisão perdeu o referencial. Gostando ou não, Glória Maria é Glória Maria. Ou alguém já viu a Patrícia Poeta conduzindo entrevistas em inglês, perdendo um pedaço da orelha em rede nacional ou se materializando na Fifth Avenue com a mesma classe? Claro que não, porque a Glória é simplesmente a única repórter septuagenária viva no Brasil atualmente que consegue manter um alto nível de profissionalismo aliado às mais avançadas técnicas de conservação biológica. E cada domingo sem Glória Maria é mais um domingo deprimente e facilitador de suicídio.
Assim sendo, pelos motivos expostos e por mais uma série de outros fatores que aqui não caberiam, inicio neste momento uma campanha nacional pela volta da Glória ao comando do Fantástico ainda em 2008. Volta, Glória Maria!

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Trauma de infância (com moral no final)

Quando eu era pequeno, o meu avô não deixava a gente puxar a descarga depois da meia-noite. Não importava o tamanho do estrago feito dentro da privada, o sono dos vizinhos não podia ser perturbado sob circunstância alguma. Ah, e nós não podíamos assistir à televisão com som também, senão ele podia acordar a qualquer momento de mais um monólogo noturno e começar a berrar palavrões muito adequados para crianças lá da sala onde ele dormia com a minha avó. Isso quando não partia pra agressão física. Pela manhã, os dejetos de uma noite inteira de silêncio no quarto de banho se amontoavam até as bordas do vaso sanitário, e, se eu não me engano, ele mesmo ia lá, orgulhoso, e mandava-os embora.

Eu tinha lá os meus 10, 12 anos e não percebia naquela época que o meu avô era uma espécie de precursor do movimento ambientalista; que, por trás de todo aquele mijo e eventuais fezes acumulados, encontrava-se um honrado guardião dos recursos naturais do nosso planeta, disfarçado de velho rabugento e brocha com espírito de porco preto. Outro dia mesmo eu assistia ao programa ‘Um Lar de Desperdício’, comandado pela irmã mais jeitosinha da Free Willy (ver foto abaixo), no GNT, e ela falava sobre como na casa dela a regra era a seguinte: se estiver amarelo, deixe assim; se estiver marrom, mande embora. Quer dizer, meu avô estava anos-luz à frente do seu tempo, já que não importava a cor da bosta toda, a gente tinha que deixar como estava, economizando milhares de litros de água por ano e, o mais gratificante de tudo: sem acordar a vizinhança.


Traumas infantis à parte, sempre que falta água aqui no bairro hoje em dia eu lembro daquela época cheia de surpresas, umas mais amarelas, outras com tendências amarronzadas, e penso: as pessoas não dão valor nenhum à água. Na última vez que o abastecimento foi suspenso por aqui, eu fui obrigado a encher a caixa do vaso pra mandar embora algo de que eu não me orgulho muito, e fiquei surpreso ao verificar a quantidade de água que vai embora a cada vez que eu aperto aquele maldito botão. Foi chocante demais para uma pessoa que não demora mais do que cinco minutos no banho, que escova os dentes assistindo televisão bem longe da torneira (fechada) e que fulmina empregadas domésticas e zeladores que usam mangueira pra varrer a calçada.

Que o mundo está acabando não é novidade nenhuma pra ninguém, além de ser um grande, grosso e doloroso clichê do nosso tempo. Mas as pessoas foram cegadas a tal ponto pelo capitalismo selvagem (clichê número dois) que chegou a hora da natureza se virar contra os humanos. Pensem em algo como o filme ‘Fim dos Tempos’, só que com diálogos convincentes e atuações boas. E sem árvores vingativas. E sem o Mark Wahlberg. Pode soar meio Sharon Stone bêbada em Cannes, mas é o karma, pessoal. Estamos entrando na era do terremoto como contenção de despesas, do tsunami como eliminação de excesso de contingente, e por aí vai. É triste, mas é verdade. É muito carro, é muita gente, é muito lixo. Não tem mais espaço. Simplesmente não tem onde caber 6 bilhões, 8 bilhões de anormais, cada uma com um carro. Graças à tecnologia e à evolução da espécie, a tendência é que as pessoas comecem a viver até os 150 anos daqui a muito pouco tempo, e eu não sei se quero estar aqui pra ver essa putaria geriátrica tomar forma.